Sempre fora a ave de rapina mais nobre dos ares
a belíssima águia esbelta
contemplada por qualquer ser voador
cultuada por todos os animais da mata fechada que o céu cobria
suas garras douradas inspirando temor
mas também a beleza
do coração mais áureo que nenhum outro bicho poderia possuir
Voando um dia, tão alto como sempre gostara
a águia pressentiu pelos ventos
que alguma coisa nova estava pra acontecer
e essa sensação a acompanhou por um período considerável
O que seria?
Os ventos sussurravam nos seus ouvidos
mas não dava para entender
Já quase desistindo de desvendar seu enigma
a ave formidável sente um sopro incômodo
o qual originava-se de determinada direção
após o sopro, um piado agudo e irritante
que vinha da copa de uma árvore bem alta
Seguindo o rumo do som esganiçado
a águia visualiza num galho
uma coisa cinza, miúda, sem graça e feia
um passarinho desesperado
como se estivesse desgarrado de algum bando
Poderia jantar aquele troço
bani-lo da existência terrena
mas não...
a rainha dos céus não comia pra destruir
Em vez disso o pássaro formoso
pousou num galho próximo
e ficou a olhar a coisinha
Curiosamente
tal mediocridade com penas
lhe despertou um leve fascínio
O passarinho tentava bater forte suas asinhas pequenas
mas sem êxito nenhum
chegou a cair alguns galhos abaixo
A águia penalizada decidiu utilizar suas garras
para carregar o serzinho
E só dessa forma ele se manteria no ar
Entretanto isso não o deixava feliz
Onde já se viu passarinho que não voa?
Acanhado ele pediu a sua amiga
que o ensinasse essa linda arte
que pertence à natureza de muitas aves
Entusiasmada, porém saudosa
a águia aceitou o desafio
amava cuidar daquele ser
mas não podia desviá-lo de seu destino
Começaram as lições de voo
uma grande dificuldade
com direito a quedas
feridas, dores, angústia
mas também determinação em grande dose
Num dia que jamais poderia ser qualquer
o passarinho cinza decidido
abriu suas asinhas pequenas
e algo interessante ocorreu
debaixo delas saíram grandes asas coloridas
tal qual ocorre com as joaninhas ou os besouros
eram enormes, porém estavam muito amassadas
A águia que não abandonava seu discípulo
ficou bastante intrigada
como um passarinho tão miúdo poderia ter asas como aquelas?
Mas elas eram tão lindas, que a águia teve a certeza de que
o destino do passarinho era mesmo o céu
e por que não o Sol?
Empolgada a águia disse para seu protegido
Veja, querido, essas asas que você tem!!!
'Que asas?', respondeu o pequenino
E o ânimo da águia desandou
seu amigo pequeno não enxergava o que possuía
Mas ainda restou-lhe tentar ensiná-lo
muitas e muitas tentativas frustradas
mas a ave de rapina
das garras douradas e do coração mais áureo dos bichos
continuou a insistir
Um dia porém, e ainda menos qualquer
ventos rebeldes sopraram
estavam tão brutos que conseguiram arrancar o passarinho
das garras da águia
O levaram para bem longe
e o deixaram cair
na parte mais fechada da mata
Desesperada a águia voou atrás
mas não conseguia achar seu amiguinho
Antes das primeiras lágrimas tristes caírem
os ventos murmuraram em seu ouvido
'calma, soberana, deixe as coisas ocorrerem, e tu vais te surpreender'
lúgubre, porém conformada, a ave magnânima seguiu o conselho
Mas manteve-se alerta sobrevoando as copas abissais
pois qualquer piado choroso que escutasse a faria mergulhar por ali
algo que sempre odiara
Nenhum piado ocorreu entretanto.
E dias foram passando
O que acontecera com o seu pupilo?
De repente acima das copas ele aparece
suas asas gigantes e coloridas abertas
batendo e fazendo ventos fortes
A águia contentou-se sem medida
por rever seu amado aprendiz
Porém queria compreender
o que ocorrera para que ele enxergasse suas asas
Antes de fazer qualquer pergunta
a águia visualizou abaixo do passarinho
um majestoso tigre branco
o príncipe da mata
mais novo amigo do ser miudinho
mais um companheiro fiel
E assim que os dias incomuns foram seguindo
Na terra o majestoso felino caminhando distintamente
acima das copas de olho em seu amigo
a avezinha cinza das gigantes asas coloridas
e sobrevoando ao redor destes seres
a linda águia grandiosa
orgulhosa dos feitos de seu aluno
e levando consigo uma sensação nostálgica
afinal, também já fora um passarinho
Três bichos leais
cada um do seu jeito
Isso poderia ser controverso
mas não...
eles se harmonizam como rimas
um inevitável rompante de versos.

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